INDIE12
10 a 14 de outubro
APRESENTAÇÃO
o desejo da revolução, descaso, acomodação, outro desejo... o cinema
Depois do verão,
ali reunidos, em uma conversa sobre a vida e sobre ideias para o Indie,
quando Cláudio Santos, da Voltz Design que cria a identidade visual do festival, nos perguntou:
- O que estamos a sofrer mais?
A pergunta nos caiu como uma pedra.
Porque sim, sempre estamos a sofrer, senão com a própria construção e realização de uma ideia para este festival independente, com as questões pessoais.
(Interessante vivenciarmos momentos de sofrimento parecidos, em tempos diferentes, uns com filhos pequenos, outros com filho adolescente, uns com pais a envelhecer, outros com pais doentes, nesse ciclo natural - e que a nós, de perto, não aceitamos como tal, que é a vida...)
Envelhecer é a parte mais complexa, exige lucidez, escolhas certas e ética. Mas se pensarmos bem, nossa grande dor, talvez venha do fato de não aceitarmos esta limitação que o trabalho nos toma de não podermos revolucionar nada ou quase nada.
No entanto,
o desejo de revolucionar
encontra-se
resguardado
em si
como desejo de produzir
algo que não compreendemos
e por isso, ainda, desafiador.
Questionar o que fazemos, a cada ano
não nos acomodar,
é, em si, manter o sofrimento,
envelhecer sem enrijecer...
e alguma chance de que ainda
tenhamos, no trabalho ou na vida,
algo que fuja daquilo já sabido.
É tão desestimulante "já saber".
Por outro lado, quem não quer este conforto?
Quem não quer se declarar 'para sempre' e acomodar-se?
E pensando no que sofremos
que encontramos as falas do cineasta japonês Masao Adachi.
Um ex-revolucionário do Exército Vermelho japonês que caiu no ostracismo,
retratado no filme documentário de Philippe Grandrieux .
Nos faz refletir sobre o cinema,
e como sofrer e revolucionar se encaixam em nossas pequenas escolhas
e no medo de não sermos nada, consistente.
O cinema mais uma vez resolve nosso conflitos,
nos colocando outros tantos mais,
(nosso mundo é tão particular e mínimo perto do "grande cinema").
No Indie, este ano, três grandes independentes e complexos diretores,
revolucionários a seu modo,
ganham retrospectiva com suas obras completas e díspares .
Nos fazem ver, e observar que não sabemos muito,
sobre a ética na Rússia: o vulcão Aleksey Balabanov.
Ou sobre a cultura negra, afro-descendente: o elegante Charles Burnett.
Ou, ainda, sobre as inúmeras facetas do olhar jovem sobre o Japão: o surpreendente Kazuyoshi Kumakiri .
E apesar de já estarmos mais experientes, com 12 anos, ainda somos adolescentes em busca de tudo o mais...
Melhor buscar aquilo que compartilhamos como ideia.
(Masao Adachi e tantos revolucionários)
Neste Indie e para todo sempre.
"Não sei o que fazer.
Não sei o que fazer.
Não sei mesmo o que fazer com todas essas coisas que não compreendo.
Mas continuo.
Isso deve ser o que eu desejo.
Isso quer dizer que estou a sofrer?
Será que estou sofrendo?
Eu sofro, eu não sofro
Eu tento sofrer, mas não, não é isso!
Eu pareço sofrer?
Eu não sofro não.
Sofremos.
Mas também não é isso.
Eu não sofro não!
Ah é isso. Isso não me faz sofrer.
As pessoas me criticam sempre,
por negar tudo sistematicamente.
Mas eu não procuro a forma negativa.
O que devo fazer?
É por isso que faço cinema.
Não posso dizer tudo isso
a não ser com o cinema."
"Vou refletir novamente
É agradável
É agradável
não é agradável
eu vejo que seria agradável
me divirto
sim, me divirto, é justo
eu me divirto, logo, sofro.
Não, é uma bela mentira,
eu sofro ao me divertir.
Dane-se, é claro que não vai funcionar.
Então esqueçamos
esqueçamos
eu minto para esquecer,
será que minto?
Mentira.
Faço filmes para mentir?
Tenho vergonha de mentir.
É verdade.
Honestidade.
Se falarmos a todo mundo honestamente
não teremos vergonha.
É isso?
Não tenho vergonha, tenho vergonha.
Isso também não tem a menor importância.
Nenhuma importância.
Lembremos da fita de Möbius.
É sempre assim.
É isso mesmo.
Möbius.
Com certeza está tudo ligado,
mas não sei desde quando.
Todos os filmes
Todos os filmes estão ligados entre si.
Será que tive fome?
Será que eu queria comer?
Passei por momentos em que quase morri de fome?
Penso que sim.
Enfrentei, por uma única vez, a verdadeira subnutrição."
"Voilá!
Qual é o ponto de origem da Revolução?
O que é um ponto de origem?
Me perguntavam
porque eu fiz a Revolução.
Eu sempre quis fazer parte da Revolução.
Mas...
Sem saber o que é a Revolução.
Então eu queria fazer alguma coisa
que não compreendia, é isso.
Eu não compreendo.
A Revolução significa: que não compreendo.
Eu quero fazer aquilo que não compreendo.
É por isso que eu faço a Revolução.
É um silogismo.
É isso.
É o melhor."
"Sua barriga está vazia, portanto você está faminto.
Você está faminto, portanto quer comer algo.
Mas você precisa de comida.
Então é disso que se trata.
É isso, eu entendi.
Sim, é justo
Enfim, tudo isso
são palavras vãs!
Não é verdade?
Não é verdade?
É verdade?"
Diálogos de Masao Adachi no filme de Philippe Grandrieux - Il se peut que la beauté ait renforcé notré resolution, Masao Adachi / É possível que a beleza tenha fortalecido nossa determinação, Masao Adachi
Francesca Azzi